"Pensei que seria bom se também eu fosse como as plantas, que minhas ações fossem um puro transbordar de vitalidade, uma pura explosão de uma beleza que cresceu por dentro e não mais pode ser guardada. Sem razoes, por puro prazer.
Mas aí olho para a mesa e um livro de capa verde me lembra que não vivo no Paraíso, que não tenho o direito de viver pelo prazer. Há deveres que me esperam. O que todos pedem de mim não é que eu floresça como os ipês, mas que eu cumpra os meus deveres – muito embora eles me levem para bem longe da minha felicidade. Daí a sabedoria do verso de Fernando Pessoa, aquele em que diz que somos o intervalo entre o nosso desejo e aquilo que o desejo dos outros fez de nós. No meu livro de capa verde estão escritos os desejos dos outros. Ele se chama agenda. Os meus desejos, não é preciso que ninguém me lembre deles. Não precisam ser escritos. Sei-os (isto mesmo, seios!) de cor. De cor que dizer no coração. Aquilo que está escrito no coração não necessita de agenda porque a gente não esquece. O que a memória ama fica eterno. Se preciso de agenda é porque não está no coração."